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domingo, 5 de maio de 2013

A ORDEM DE MARIA


 Públio José – jornalista
(publiojose@gmail.com.)
 
                        O cenário é de uma festa de casamento. Estamos há mais de dois mil anos atrás, quando Jesus Cristo, seus apóstolos e sua mãe, Maria, comparecem às bodas de um jovem casal, em Caná da Galileia. Caná vem do hebraico e significa cana. O nome, assim, provém da proximidade da aldeia com uma área de alagadiço, com certeza terreno propício à plantação do vegetal. Era também o lugar de nascimento de Natanael, um dos apóstolos de Jesus, e ganhou fama e notoriedade como local do primeiro milagre de Jesus. A passagem é clássica e integra o relato, registrado na Bíblia, do evangelho escrito pelo apóstolo João. Ao que tudo indica, a festa seguia normalmente quando seus organizadores observam que ia faltar vinho. (Imaginem a bebida faltar em plena festa! Seria um transtorno para o noivo!) De imediato, parentes do noivo solicitam a Maria uma intervenção, uma solução para o problema.
                        Ela, numa atitude natural, como amiga da família, e também querendo retirar do currículo da festa o constrangimento geral que redundaria a falta da bebida, dirige-se ao filho. O gesto de Maria implica várias deduções e ecoa para a posteridade como semente, lastro, elemento impactante para o acontecimento que viria a seguir. Da cena se conclui, em primeiro lugar, ser Jesus – pelo menos até aquele momento – desconhecido no ambiente. Pois, ao invés de procurá-lo para acudi-los, os responsáveis se dirigem a Maria. Ela, por sua vez, deveria ter um forte motivo ou, no mínimo, uma vaga convicção de que o filho representava a solução para o problema. Sabe-se perfeitamente que Jesus não mantinha nenhum envolvimento com o comércio do vinho. Como é certo, também, não ter ele à mão, no momento, nenhum elemento que justificasse, humanamente falando, ser solicitado para sanar a questão.
                        Qual a explicação, então, para Maria dirigir-se a ele? Por ser seu filho? É pouco provável. O que Jesus sugere de extraordinário, o que sinaliza, o que manifesta para que ela o veja em condições de trazer outro desfecho à situação? Soa estranho, por outro lado – quase beirando à reprimenda – a maneira como Jesus, em resposta, se dirige à mãe: “Mulher, que tenho eu contigo?”. Colocada de forma pública, tal afirmação deve ter causado constrangimento a Maria. O texto, entretanto, não se refere a essa circunstância nem reporta nenhuma atitude sua decorrente da exclamação de Jesus. Enigmas à parte, o que se deduz do episódio é que Maria entrou nele como figura principal – em razão de ter sido vista como solução à falta do vinho – e saiu como coadjuvante, deixando para Jesus o papel principal do fantástico enredo. E – mais mistério ainda – portando uma ordem: “Fazei tudo quanto ele vos mandar”.
                        Saberia ela, então, dos atributos divinos do filho, já tendo vivenciado milagres anteriores por ele promovidos, motivo pelo qual fez dele o foco principal do evento? Ou, além disso, já antecipava sua autoridade de Deus e o poder de solucionar problemas a ponto de encaminhar-lhe a questão e solicitar aos presentes obediência a ele “em tudo?” O certo é que a frase de Maria transcende, em muito, sua própria circunscrição. É a constatação de que em Jesus estão presentes os atributos necessários e suficientes à condição de ser procurado, ouvido, seguido, obedecido. Após sua ordem “Fazei tudo quanto ele vos mandar” Maria saiu de cena, deixando a Jesus o foco, a atenção, o mando, o poder, a autoridade, entronizando-o no ambiente como pessoa capacitada a merecer a confiança, o crédito e a obediência dos presentes. E o vinho? Bom, o milagre aconteceu. Voltou a ser servido. Farto. De qualidade. Excelente.

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